Thursday, June 21, 2007

Ósculo


Ontem encontrei um ósculo, por mero acaso...

Já o procurara na escola em jogos nos quais, enquanto crianças, experimentávamos sensações... Já o buscara em jardins passeando acompanhada por entre flores cheirando a Primavera ou árvores despindo-se de cores... Já o entrevira entre actividades nas férias de Verão...

Mas foi ao luar (oh! A lua tão grande lá no alto!), enquanto nos olhávamos numa conversa silenciosa, que o encontrei finalmente... Foram as tuas mãos nas minhas. Foram os teus braços envolvendo-me. E as nossas almas unindo-se num beijo profundo...

Monday, June 18, 2007

Beringela

"Que arma do crime tão estranha..." - pensou o Inspector - "Mas também tudo serve quando o ódio supera a razão!". Não deixava de ser, no entanto, uma forma bastante peculiar de usar uma beringela...
A vítima vivia sozinha, tinha 41 anos e um trabalho bastante monótono. Não parecia ser homem de grandes paixões (tudo na casa era prático e convencional), nem de as despertar( tinha aspecto de ser mais velho e de costumes bastante regulares).
Segundo a vizinha que o encontrára, uma senhora dos seus 60 anos e com ar de ser bastante intrometida, era uma pessoa simpática e pacata, de boa súde, "que nunca lhe parecera do tipo de acabar com a vida assim de um momento para o outro, ainda para mais andava a combinar uma viagenzita à terra para visitar os pais (que ainda eram vivos e de quem se dizia serem descentes de uma aristocrata qualquer), sabe que eu reparo muito nestas coisas e vi logo, mal lhe pus a vista em cima quando veio p'raqui morar, que tinha um porte elegante e por isso a história deve ser verdadeira, além do que era muito generoso e por isso devia ser muito rico", etc, etc, etc. O porte elegante o Inspector não via aonde e em relação a riquezas, a vítima parecia viver de forma bastante modesta, por isso deixou-se estar a ouvir a pobre senhora sem tomar grande atenção ao que esta dizia.
Segundo os perito forenses não havia impressões digitais na "arma do crime". O Inspector olhou em volta. Tudo arrumado, perfeitamente normal, excepto um corpo no meio da sala com uma beringela enfiada na boca. Não havia bilhete em lado algum, mas também nem todos os suicidas decidem deixar mensagens para quem os encontra.

A investigação não durou muito. Passado uns dias, ao investigar o passado da vítima, o Inspector encontrou um incidente que lhe despertou a atenção: um concurso de vegetais em que a vítima saíra vencedora graças a uma beringela! O Inspector não tinha muitas esperanças, mas nunca se sabe a que é que uma pessoa pode guardar ressentimentos...
Foi-se a ver, o 2º premiado tinha estado na cidade nessa altura, pela 1ª vez em dez anos. A tal vizinha tinha-o visto sair do prédio nesse dia pouco antes de encontrar a vítima. E as únicas impressões digitais recentees encontradas na casa para além das da vítima e das da vizinha, encontradas na porta e, foi-se depois a ver, na caixa de lembranças onde a vítima ainda guardava o prémio, correspondiam ao suspeito.
Ao que parecia, graças àquele prémio, a vítima tinha "ganho" uma esposa (entretanto falecida) e o suspeito perdido uma namorada muito querida...

Wednesday, June 13, 2007

Essência


A Essência de Mim


Uma profunda desilusão me preenche quando a ilusão de mim desaparece. Esta é uma máscara de uma espessura exagerada, mas surpreendentemente translúcida.

Sou demasiado eu para ser outrém. Sinto-me demasiado eu para ser feliz. Vejo-me demasiado nada para ser alguém.

A minha máscara não resulta, nada me protege do mundo. Como o reflexo de essência (a minha) que é, sem a mostrar realmente, ante mim flutua, absorvendo a realidade e devolvendo apenas o vazio que a preenche.

Tuesday, June 5, 2007

Infinito



Um dia enquanto dormia caí no Infinito. Qual é que não sei...

Era agradável e aterrador simultaneamente. Milhares de inidentificáveis objectos me rodeavam, infinitos... E eu, singular, entre eles.

De repente, também eu me tornava infinita na medida em que era constituída por biliões de células em constante divisão, que por sua vez eram constituídas por milhentas moléculas (proteínas, lípidos, glícidos, etc) e estas por átomos e estes por protões, electrões e neutrões e estes...e por aí fora, constantemente, diminuindo-se a escala, aumentando-se o número, variando-se o Infinito...

Um dia enquanto dormia, caí no Infinito.

Acordei com uma nova compreensão do Mundo...

Monday, June 4, 2007

Momento

- "Desculpe...!"

Susana olhava distraída o céu enquanto andava.

- "Desculpe...será que..."

Uma mão no ombro fê-la virar-se. À sua frente um rapaz moreno, alto, sensivelmente da sua idade, olhava-a através de uns olhos verdes, curioso.

- "Sim...?" - inquiriu Susana. Havia algo nele de familiar...Talvez a expressão, a mesma que nela própria se constatava quando concentrada, observava a singular beleza do mundo para a captar nas suas fotografias.

- "Será que a posso desenhar?...Demoraria só um instante.

- "Mas...?"

- "Por favor...?"

- "O.K." - Susana sentia-se intrigada - "Já agora, chamo-me Susana." - Sorriu.

- "Luís."

Um sorriso iluminou-lhe a cara. Como era belo quando sorria...

- "Podemos sentar-nos naqueles degraus."

Enquanto Luís desenhava, Susana continuou a observá-lo. A expressão de concentração era agora bem marcada, mas de vez em quando quebrada por uma expressão de surpresa que parecia deliciá-lo.

- "Sabe...parece que a conheço...os seus traços, linhas, feições. É como se já a tivesse desenhado ou com as mão delineado os seus contornos..."

Ambos coraram.

Quando acabou de desenhar, quedou-se a olhá-la. Mas era um olhar que não a incomodava, pois era como se já fizesse parte da sua vida. Uma extensão esverdeada do seu próprio olhar. Um verde observar do mundo.

Olhávam-se como se já se conhecessem. Olhavam-se para se conhecerem...

Um vento frio começou a soprar.

- "Por um momento senti que o conhecia, Luís. Os seus sentimentos, os seus pensamentos, os seus segredos..."

- "Sim, por um momento, eu também..."

A mesma expressão espelhou-se nas suas caras.

- "Começa a ficar frio. E se fossemos tomar um café?"