Wednesday, December 26, 2007

Harmonia


Rosa, em pintas, linhas, num padrão irrepetível sobre um fundo verde.
Aveludado, tão suave ao toque dos meus dedos. Pequenas pétalas assimétricas num pentágono imperfeito, como se de borboletas se tratassem, livres, voando.
No centro, como uma mão estendida, convidativa, o labelo.
Flor após flor até otão, num ciclo decrescente, como se um novo futuro, quase como se um novo mundo, esperasse suspenso na ponta de cada caule, para desabrochar. Por toda a volta do caule se mostram, como querendo ver o mundo de todo o lado.
O caule principal longo e tão verde que quase irradia um brilho esmeralda, mas curvando gentilmente para a direita, parecendo as flores belos pássaros em descanso.
Na realidade são dois os caules principais, quase despidos de folhas. Estas escondem as suas raízes de tão longas e largas, espessamente vertendo do vazo, como se tentando tocar o solo do solo de onde nascem. Possuem delgadas e elegantes nervuras percorrendo-lhes o corpo, nutrindo-as e levando alimento ao resto da planta. A contraluz parecem o mais intrincado e delicado bordado do mais precioso fio.
As suas raízes, grossas e de um pálido verde, mergulham na terra escura, desaparecendo em busca da fonte de nutrição, da origem da vida.

É assim a orquídea que tenho no meu quarto.

Um pedaço de harmonia e beleza sobre um fundo azul...

Friday, November 23, 2007

Frio/ Neve/ Gelo


Frio...Frio...Tenho frio...E as minhas pernas continuam a caminhar, as botas enterrando-se fundo na neve. Branco...É tudo o que vislumbro à minha volta.Tranquilo...puro...como uma superfície única, lisa, compacta. Eu caminhando, avançando e a paisagem permanecendo inalterada: os mesmos passos fundos atrás de mim, os mesmos picos de gelo ao longe brilhando, o mesmo momento uma e outra vez...Um passo.Um passo.Um passo.
Pequenas nuvens de vapor se formam e elevam à minha frente. Tento respirar com calma, mas não demasiado profundo...Essas nuvens são calor e vida que preco a cada respiração.

Estou insensível a tudo, menos ao frio que penetra por todas as frestas da minha roupa. É aquele vento forte que se levanta, sem obstáculos que o impeçam de correr pela superfície plana e imaculada do norte.

Continuo a mover-me, sempre, sem destino, seguindo apenas uma linha recta, pois não tenho forças para mudar de direcção...Sigo, na esperança de que algum dos meus companheiros me onsiga encontrar. Pelo menos dois dias passaram desde a tempestade de neve em que me perdi deles; com certeza que teriam pedido ajuda e agora me procuravam...A menos que como eu se tivessem desviado do acampamento, cegos pela neve que nos fustigava o rosto e o medo do frio e agora caminhassem, como eu, sem rumo, tentando simplesmente sobreviver, sobrevivendo na esperança de serem salvos por alguém...talvez por mim...

Saturday, November 3, 2007

Transcendente


Saltei um dia da janela só para ver como seria...

Apoiada na janela apreciei a perspectiva. Era como se estivesse suspensa no ar, pairando sobre a azáfama, flutuando entre pensamentos, suspensa como uma folha prestes a cair. E entretanto o ar batia-me na cara, fazendo remoinhos no meu cabelo, chamando-me, incitando-me a ele me juntar. Era como se dissesse "vem, vamos voar...temos nuvens para mover, chuvas e trovoadas para provocar, desertos para percorrer, praias para esvaziar, roupas para arrancar, letras, páginas, livros, jornais para folhear, bolas de sabão para soprar e subir, subir, subir até desaparecerem; temos um mundo inteiro para explorar e tu pouco tempo para o descobrir..."
Mas eu hesitava, oservando as pessoas que passavam, tão concentradas nos seus pequenos afazeres, deveres ou pecados...Tantas vidas, tantas...Uma tão grande variadade de formas de viver passava por mim que quase me senti explodir com a imensidão de possibilidades. E todas as pequenas luzes que se começavam a acender apenas significavam mais, preocupadas com o jantar, com o projecto por acabar, com a culpa sabe-se lá de que segredos, com os olhos ou os lábios, sim definitivamente os lábios, da recém descoberta alma-gémea, com as saudades da recentemente perdida...
E eu passivamente observando, analisando e pensando tudo aquilo, ou talvez não tão passivamente, porque de repente comecei a preocupar-me com teste do dia seguinte, com a falta que me faziam os seus olhos, com as milhentas pequenas coisas que nos preenchem o quotidiano...
Foi quando caí, sem amparo, livremente condicionada a um futuro definitivo. Será que caía como todos os outros num poço de preocupações ou que contrariamente a eles, caía para não me preocupar?

A dor da queda foi o momento do meu acordar, tranpirando, pensando naquele sonho surrealmente real e transcendente...

Aconchego


Imagens...Palavras...É o que me preenche o pensamento ultimamente, como uma espécie de obcessão.

Quando passeio ou em quase tudo o que faço, facilmente me distraio por um reflexo numa superfície inesperada, por um ângulo menos usual de perspectiva; por um raio de luz num rosto, nuns olhos, numa folha, numa flor, na calçada, na fachada de um edifício, numa poça de água; pelo voo errático e belo de uma borboleta; por uma expressão particular num dos vários rostos que encontro por acaso no metro, rua, faculdade; pelo sorriso reconfortante na cara de um amigo; pela graciosidade dos movimentos de alguém enquanto conta uma história.

E tudo isso, tudo, eu quero fotografar nesse instante ou para sempre gravar na minha memória e transmitir depois a outros por palavras. Pois parecem sempre, tal como são, irrepetíveis e incrivelmente belos...

É talvez por isso que procuro incessantemente palavras...
É talvez nisso que encontro o meu aconchego e a minha forma de amar...

Saturday, October 6, 2007

Algodão



Sinto-me permanentemente na sombra... Talvez um desses pedaços de algodão que atravessam o céu me ande a perseguir, não sei...Mas parece que o meu mundo de cor, de luz se perdeu em tons de cinzento...

Cada vez menos sei identificar sentimentos, perceber relações; é como se me encontrasse num eterno baile de máscaras em que os disfarces se alteram constantemente sem nunca mostrar a pessoa que os enverga. É cada vez mais difícil tocar a alma de alguém, partilhar intimidades...

Sinto-me desorientada numa sociedade de acções e interacções que não compreendo. Amizades que se desvanecem, cumplicidades que se abandonam, amores que se perdem, pouco a pouco, por falta de compreensão; muitas vezes sem que uma das partes se aperceba, por vezes apesar de ambas o lamentarem, outras vezes porque partilharam algo que (talvez) não permita voltar a trás...

Mas de quando em quando, as nuvens afastam-se um pouco e um raio de luz devolve sentido ao meu mundo, mostrando-me almas que me querem e que quero conhecer...

Tuesday, October 2, 2007

Mar




O mar não é apenas um fenómeno da Natureza ou o local de origem da Vida.

...Não simplesmente olhares transcritos em papel...


Não é só ondas e adrenalina. Não é apenas fonte de alimento ou de terrores.

Não é sepultura.
Não é praias e costas e divisor de continentes.


O mar é uma emoção, um sentimento, toda uma experiência.


É um inspirar de algo mais profundo, antigo e poderoso do que nós.

É toda uma vida ou uma amálgama de vidas num mergulho.


É algo que só pode ser sentido, mas tão avassalador que

todo o nosso corpo participa

e a alma quase que não o contém...

Tuesday, September 25, 2007

Sopro



Digam-me... que o sol trás as estrelas e a lua a madrugada...

Digam-me que posso ter o Universo na palma da minha mão...

Digam-me palavras vâs e ocas de sentido para que nelas acredite...

Digam-me...digam-me verdades ocultas em decepções...

Digam-me que o eterno é o longo olhar do tempo...

Digam-me que o mundo acaba de cada vez que alguém morre...

Digam-me que a Verdade é apenas fruto da imaginação...

Digam-me que ao vento solte palavras, para que como um sopro cheguem à alma de toda a gente...



Saturday, September 22, 2007

Simbiose


Julgo que existe, entre mim e a música, uma espécie de simbiose. Eu sei que simbiose é uma relação entre organismos de espécies diferentes, mas não estará a música de certa forma viva?

Afinal a sua origem reside nos seres humanos que a criam e é neles que ela vive até se "aninhar" na alma do próximo, popagando-se na partilha, infiltrando-se através dos sons captados pelos ouvidos, vivendo da emoção, adrenalina e prazer que provoca.

Descrevendo-a assim mais se parece com um parasita, mas considerando que é (pelo menos para mim) impossível sobreviver sem ela, simbiose torna-se na descrição perfeita. É em nós que a música habita. É com ela que preenchemos, enquadramos e experienciamos a Vida.

Claro que existem vários géneros musicais e dentro deles ainda mais variedade, mas isso ocorre precisamente devido à multiplicidade e unicidade das pessoas que habitam este planeta. E é no encontrar o género ou banda de que gostamos que a relação de simbiose com a música se torna perfeita!

E se acreditarmos, como dizia o inventor Nikola Tesla, que a Terra é um condutor de ressonância acústica, e considerarmos que evoluímos por adaptação a este planeta, não será de concluir que esta relação é possível?

Friday, September 14, 2007

Palavras


Palavras soltas...É tudo o que me vem á cabeça quando tento escrever...

Palavras soltas. Pensamentos desconexos. Memórias várias. Em fios que não se entrelaçam. Em tramas que nunca se formam.
Sinto-me assim repleta de algo que não consigo explicar; incompleta por o não perceber.

Rodeada de pedaços de mim, deitada na cama, procuro libertá-las, sair...

Monday, September 3, 2007

Magia



Alguma vez sentiram os lábios selados? Tão unidos como se nunca mais se fossem abrir? Tão colados que parece que nunca mais os querem abrir?


É como se ao "perder" a capacidade de falar, pudesse absorver e compreender o mundo só com o Olhar, Ouvir, Cheira...Passo a ser apenas uma espectadora, do lado de fora do jogo, passivamente reflectindo e criticando os passos dos outros, de tudo. Torno-me parte do meio, em vez do algo que dele depende. Sinto-me mais completa. Toda eu olhos, ouvidos e nariz...Toda eu nada e ao mesmo tempo contendo o segredo do Universo, essa grande pergunta que se encontra gravada no mais fundo do nosso intelecto, da nossa curiosidade...
Sinto-me prestes a descobrir e perceber esse grande mistério...É então que tenho de falar (a comunicação é a base da civilização humana) e a magia se perde...

Monday, August 27, 2007

Lambisgóia



O sol batia-lhe nas costas enquanto trabalhava. Acartava caixas e caixas de loiça, fotografias, livros, objectos vários que compõe o "lixo" que se acumula numa casa em que se vive há muito tempo. Não era um trabalho de que gostasse especialmente, mas não exigia assim tanto de si e sempre dava para ganhar uns trocos nas férias.
Mas desta vez e pela primeira vez desde que começara, sentia-se profundamente irritado. Não pelo trabalho em si, mas pelo facto de, apesar de o ver suar sob aquele sol ardente, aquela lambisgóia não o largar... Petulante andava à sua volta alternando tiradas antipáticas e bastante afectadas sobre o quão desajeitado era e as consequências de estragar algum dos seus preciosos objectos com perguntas mascaradas sobre a sua vida pessoal.
"Então, já alguma menina o enredou nos seus encantos?...CUIDADO que esses copos de cristal já são do tempo da minha bisavó! ... Mas diga-me lá, em que dispende o tempo que este trabalho de deixa?...Gosta de trabalhar em jardiiiINNÃO FAÇA ISSO! Tem de lhe pegar de lado. De LADO ouviu?!? Ah...Mas continuando..."
Que CHATA!!! E ele a ter de aguentar aquilo...Afinal queria ser pago no final ... E bem o merecia!
Mas que raio queria a mulher? Será que não tinha nada de mais importante para fazer? Com tantos objectos do tempo dos tetraavós ou assim, tanta foto de família, amigos e famosos, tantos quartos, tanto espaço...Vazio...Foi então que percebeu. Porquê tanta pergunta. Porquê apenas ele e o rapaz que arrumava as coisas na carrinha para tanto coisa. Porquê mudar para uma casa mais pequena, bem no centro da cidade. Ela sentia-se sozinha...
Talvez umas perguntas não fossem assim tão más. E uns minutos de conversa nunca fizeram mal a ninguém...

Sunday, August 19, 2007

Hipotética


A verdade... Sim, a verdade me pedes enquanto me olhas nos olhos...Mas nada é assim tão simples. O mundo encontra-se cheio de tonalidades de cinzento...

Era verdade que te amava quando o disse naquela noite.
Eram verdade todos os planos que fizemos para nós.
Era verdade a emoção que o teu toque me provocava.
Era verdade a alegria do meu sorriso.
Era verdade a tristeza da separação.
Eram verdade as lágrimas de saudade.

É verdade que doeu. Mas também é verdade que tudo acaba por passar.

A verdade que me pedes é assim hipotética, pois tem como finalidade encontrar possíveis continuações para uma realidade já finalizada...

Sunday, August 12, 2007

Libelinha




Olho para o céu enquanto uma brisa suave brinca com os meus cabelos. As nuvens passeiam, feitas farrapos ao vento, pelo profundo azul que se reflecte no mar ou no qual o mar se reflecte.Fecho os olhos...Ao longe ouço o murmurar das ondas, cujo vai e vem marca a cadência do meu presente. Deitada na praia, praticamente isolada, quase que deixo a minha humanidade, o meu corpo, para trás. Apenas uma alma, um pensamento, procurando-se no Universo...Sinto algo pousar-me no peito. Abro os olhos e a libelinha parte, trazendo-me de volta às batidas do meu coração...

Friday, July 13, 2007

Bonita


De cada vez que a via uma única palavra o assolava de repente: bonita.

Com tantas palavras e tantas características passíveis de a descrever, era sempre naquela que pensava quando se lembrava dela. Tentou banalizar a palavra associando-a a outras coisas: bonita árvore, bonita paisagem, bonita chávena, bonita camisola, bonita caneta, bonita...Mas todas as vezes que a dizia, de todas as vezes que aquela palavra se formava nos seus lábios, era a face dela que lhe aparecia e assim via-a em todo o lado: nas árvores quando caminhava pela rua, na paisagem da sua janela, na chávena do café, na camisola que vestia de manhã, na caneta com que entretanto lhe começou a dedicar poemas! Ele...a escrever poemas! Não entendia...Está bem que ela era bonita...Não!...Linda...Não!...Simplesmente e incrivelmente interessante, misteriosa, inteligente, extrovertida, maravilhosa...bonita...Lá estava aquela palavra outra vez...! Com o tanto que ela era, ele achava aquela palavra simples demais...simples como as sua linhas, natural como o seu sorriso, pura como a sua pele, inocente como o seu olhar...bonita.

Um dia, enquanto conversavam sentados num jardim, ela perguntou-lhe de repente: "Achas-me bonita?". E ele, sorrindo, compreendendo enfim..."Sim".

Thursday, July 12, 2007

Bucólico


Enquanto crescia eu tinha da minha janela a vista mais bonita do mundo: a Serra de Sintra.

Durante anos esse paraíso bucólico, musa de poetas e pintores, terra de lendas e fantasia foi o centro do meu imaginário...Todos os dias a contemplava, por vezes encoberta por uma névoa de mistério, outras vezes brilhando com o sol da manhã. Ao percorrer as suas estradas, ao penetrar os seus bosques ou ao descobrir os seus monumentos, sentia uma espécie de nostalgia pelo passado, por tudo o que já teria ocorrido naquela maravilhosa Serra.

Um dia construíram entre mim e a Serra uma fábrica de papel e a paisagem bucólica perdeu-se. Mas é ainda com a mesma sensação de magia e admiração que visito a Serra de Sintra...

Thursday, June 21, 2007

Ósculo


Ontem encontrei um ósculo, por mero acaso...

Já o procurara na escola em jogos nos quais, enquanto crianças, experimentávamos sensações... Já o buscara em jardins passeando acompanhada por entre flores cheirando a Primavera ou árvores despindo-se de cores... Já o entrevira entre actividades nas férias de Verão...

Mas foi ao luar (oh! A lua tão grande lá no alto!), enquanto nos olhávamos numa conversa silenciosa, que o encontrei finalmente... Foram as tuas mãos nas minhas. Foram os teus braços envolvendo-me. E as nossas almas unindo-se num beijo profundo...

Monday, June 18, 2007

Beringela

"Que arma do crime tão estranha..." - pensou o Inspector - "Mas também tudo serve quando o ódio supera a razão!". Não deixava de ser, no entanto, uma forma bastante peculiar de usar uma beringela...
A vítima vivia sozinha, tinha 41 anos e um trabalho bastante monótono. Não parecia ser homem de grandes paixões (tudo na casa era prático e convencional), nem de as despertar( tinha aspecto de ser mais velho e de costumes bastante regulares).
Segundo a vizinha que o encontrára, uma senhora dos seus 60 anos e com ar de ser bastante intrometida, era uma pessoa simpática e pacata, de boa súde, "que nunca lhe parecera do tipo de acabar com a vida assim de um momento para o outro, ainda para mais andava a combinar uma viagenzita à terra para visitar os pais (que ainda eram vivos e de quem se dizia serem descentes de uma aristocrata qualquer), sabe que eu reparo muito nestas coisas e vi logo, mal lhe pus a vista em cima quando veio p'raqui morar, que tinha um porte elegante e por isso a história deve ser verdadeira, além do que era muito generoso e por isso devia ser muito rico", etc, etc, etc. O porte elegante o Inspector não via aonde e em relação a riquezas, a vítima parecia viver de forma bastante modesta, por isso deixou-se estar a ouvir a pobre senhora sem tomar grande atenção ao que esta dizia.
Segundo os perito forenses não havia impressões digitais na "arma do crime". O Inspector olhou em volta. Tudo arrumado, perfeitamente normal, excepto um corpo no meio da sala com uma beringela enfiada na boca. Não havia bilhete em lado algum, mas também nem todos os suicidas decidem deixar mensagens para quem os encontra.

A investigação não durou muito. Passado uns dias, ao investigar o passado da vítima, o Inspector encontrou um incidente que lhe despertou a atenção: um concurso de vegetais em que a vítima saíra vencedora graças a uma beringela! O Inspector não tinha muitas esperanças, mas nunca se sabe a que é que uma pessoa pode guardar ressentimentos...
Foi-se a ver, o 2º premiado tinha estado na cidade nessa altura, pela 1ª vez em dez anos. A tal vizinha tinha-o visto sair do prédio nesse dia pouco antes de encontrar a vítima. E as únicas impressões digitais recentees encontradas na casa para além das da vítima e das da vizinha, encontradas na porta e, foi-se depois a ver, na caixa de lembranças onde a vítima ainda guardava o prémio, correspondiam ao suspeito.
Ao que parecia, graças àquele prémio, a vítima tinha "ganho" uma esposa (entretanto falecida) e o suspeito perdido uma namorada muito querida...

Wednesday, June 13, 2007

Essência


A Essência de Mim


Uma profunda desilusão me preenche quando a ilusão de mim desaparece. Esta é uma máscara de uma espessura exagerada, mas surpreendentemente translúcida.

Sou demasiado eu para ser outrém. Sinto-me demasiado eu para ser feliz. Vejo-me demasiado nada para ser alguém.

A minha máscara não resulta, nada me protege do mundo. Como o reflexo de essência (a minha) que é, sem a mostrar realmente, ante mim flutua, absorvendo a realidade e devolvendo apenas o vazio que a preenche.

Tuesday, June 5, 2007

Infinito



Um dia enquanto dormia caí no Infinito. Qual é que não sei...

Era agradável e aterrador simultaneamente. Milhares de inidentificáveis objectos me rodeavam, infinitos... E eu, singular, entre eles.

De repente, também eu me tornava infinita na medida em que era constituída por biliões de células em constante divisão, que por sua vez eram constituídas por milhentas moléculas (proteínas, lípidos, glícidos, etc) e estas por átomos e estes por protões, electrões e neutrões e estes...e por aí fora, constantemente, diminuindo-se a escala, aumentando-se o número, variando-se o Infinito...

Um dia enquanto dormia, caí no Infinito.

Acordei com uma nova compreensão do Mundo...

Monday, June 4, 2007

Momento

- "Desculpe...!"

Susana olhava distraída o céu enquanto andava.

- "Desculpe...será que..."

Uma mão no ombro fê-la virar-se. À sua frente um rapaz moreno, alto, sensivelmente da sua idade, olhava-a através de uns olhos verdes, curioso.

- "Sim...?" - inquiriu Susana. Havia algo nele de familiar...Talvez a expressão, a mesma que nela própria se constatava quando concentrada, observava a singular beleza do mundo para a captar nas suas fotografias.

- "Será que a posso desenhar?...Demoraria só um instante.

- "Mas...?"

- "Por favor...?"

- "O.K." - Susana sentia-se intrigada - "Já agora, chamo-me Susana." - Sorriu.

- "Luís."

Um sorriso iluminou-lhe a cara. Como era belo quando sorria...

- "Podemos sentar-nos naqueles degraus."

Enquanto Luís desenhava, Susana continuou a observá-lo. A expressão de concentração era agora bem marcada, mas de vez em quando quebrada por uma expressão de surpresa que parecia deliciá-lo.

- "Sabe...parece que a conheço...os seus traços, linhas, feições. É como se já a tivesse desenhado ou com as mão delineado os seus contornos..."

Ambos coraram.

Quando acabou de desenhar, quedou-se a olhá-la. Mas era um olhar que não a incomodava, pois era como se já fizesse parte da sua vida. Uma extensão esverdeada do seu próprio olhar. Um verde observar do mundo.

Olhávam-se como se já se conhecessem. Olhavam-se para se conhecerem...

Um vento frio começou a soprar.

- "Por um momento senti que o conhecia, Luís. Os seus sentimentos, os seus pensamentos, os seus segredos..."

- "Sim, por um momento, eu também..."

A mesma expressão espelhou-se nas suas caras.

- "Começa a ficar frio. E se fossemos tomar um café?"