Thursday, January 22, 2009

Mimo


Eu não seria minha amiga se me conhecesse.

Não me aturaria ao final de uma tarde de estudo. Não suportaria os meus risos estridentes e retumbantes, que saltitam pelas paredes...AH...AH...AH...percorrendo todo o edifício, perfurando bem fundo os ouvidos, irritando o cérebro. Não atenderia as minhas chamadas telefónicas nem me telefonaria para falar da novela, do meu dia, do teu dia, daquele livro, daquele filme, para combinar uma noite ou uma tarde ou uma semana onde quer que seja. Não responderia aos convites para cafés, tardes preguiçosas a falar, a comer, a beber, a fumar (activa ou passivamente), a discutir política, perturbações mentais, sexualidade, filosofia, física ou batatas (fritas, cozidas, assadas, escalfadas, tanto faz, desde que seja sem grelos, por favor). Não leria os meus textos (palavras soltas na blogoesfera ou em blocos de notas; soltas pois claro, livres de mim). Não ouviria os embriagados poemas abandonados, soltos, gritados pela calçada, pendurados em estendais, enfiados em caixas de correio, por baixo de portas ou em mãos estendidas. Mandar-me-ia calar, oh sim calar, mal o mais pequeno ruído musical tentasse emergir da minha garganta. Não passaria uma tarde a sofrer golos só porque (novidade) não sei jogar matraquilhos. Não me quereria no meu aniversário. Não teria paciência para os meus gostos musicais nem para as minhas incessantes interrupções com "ouve só mais esta!" Não quereria saber porque suspiro ao olhar para a lua ou porque um arco-íris me faz feliz ou porque olho o céu, sempre, com esperança, não interessando o tempo que faz. Não me faria diferença a minha busca intensiva por palavras, o meu interesse por fotografia ou pela forma como a luz pousa, suave, à tarde, sobre tudo...

Mas como não me conheço, penso que sim, sou um mimo!




fotografia por Isabella Daguer

2 comments:

Anonymous said...

tu és um mimo que não sabe o mimo que é!

:)

Anonymous said...

um mimo de facto...